segunda-feira, 15 de outubro de 2007

EVITAR DECEPÇÕES...


Chuang Tzu relata que, certa vez, um rapaz cheio de dúvidas em relação ao caminho espiritual procurou Lao Tsé.

- Por favor, ajude-me - disse o jovem - vim até o senhor porque não consigo entender certas coisas. Quando não consigo fazer o bem, machuco outras pessoas. Mas, quando faço o bem, machuco a mim mesmo. Sou negligente se não cumpro com o dever de ser bondoso. Porém, se cumpro com esse dever prejudico a mim mesmo. Como posso resolver isso?

- Você realmente está confuso, - respondeu Lao Tsé - está tentando medir o meio do mar com uma vara de dois metros. Você deseja uma resposta? Observe uma criança! Ela não se preocupa com relatórios sobre si mesma. É desinteressada. Age com espontaneidade. Ela é parte da corrente. Não fica procurando respostas o tempo inteiro. Mas é conduzida a elas. Esse é o início da perfeição!

Podemos sofrer por inúmeras razões. Até mesmo por desejarmos melhorar. Isso soa estranho! Como podemos sofrer por aspirarmos à perfeição e à felicidade?

O desejo pode ser uma faca de dois gumes. Se queremos melhorar o nosso comportamento porque descobrimos que isso, por si só, nos torna felizes e nos dá prazer, então temos um motivo correto. No entanto, se desejamos adquirir virtudes e cultivar qualidades por acreditarmos que, com isso, seremos reconhecidos e bem tratados pelas outras pessoas, então apenas criamos mais um problema.

Ou se é bondoso porque se é, ou não se é bondoso.

As recompensas que advêm da prática do bem, não devem ser esperadas.

Quem é verdadeiramente virtuoso é desinteressado como uma criança. Pratica o bem sem pensar em retorno para si.

Existem muitas pessoas estressadas, confusas e perturbadas em nossa sociedade. Elas freqüentemente são agressivas ou mesmo indiferentes no trato com o semelhante. Precisamos de uma boa dose de compaixão e paciência para lidarmos com indivíduos assim. Só que não podemos ser compassivos e tolerantes por muito tempo se estivermos na expectativa de termos a nossa boa vontade identificada por todos. E ainda que consigamos demonstrar persistência na prática do bem diante das incompreensões e dos maus tratos, a nossa bondade não será verdadeira se estivermos interessados em que ela apareça.

A história que descreve a iluminação de Sidarta ilustra bem isso. Quando Sidarta abandonou a sua vida principesca e foi viver como asceta, em certo momento lhe ocorreu que talvez estivesse fazendo aquilo pelo prazer de ser admirado pelos outros. Percebendo isso, ele abandona os rigores do ascetismo e, então algum tempo depois, ele se torna Buda - O Iluminado.

A mesma idéia está presente no Evangelho de Jesus segundo Lucas, na parábola do fariseu e do publicano. Explicando esta historieta, Jesus deixa bem claro que, quem deseja mostrar pureza, justiça e correção, de nenhum modo é possuidor dessas qualidades. Algo semelhante é dito por Lao Tsé no Tao te King: “Quem dá valor a si mesmo, não é valorizado. Quem se julga importante, não merece importância. Quem louva a si mesmo, não é grande.”

Aquele que se esforça em parecer bondoso aos olhos dos homens, ou degenera para a mais abjeta hipocrisia, ou, no caso de existirem boas intenções, apenas consegue se frustrar com a insensibilidade alheia.

Nós devemos seguir em nossa caminhada espiritual como uma criança, que não tem a pretensão de ser grande ou pequena, mas apenas quer ser o que é.

Somente assim poderemos evitar sofrimentos e desilusões.

Não devemos culpar o mundo pelas nossas decepções, nem atribuir a ele a nossa amargura.

Porque não é o mundo a causa do desânimo de uma pessoa, mas sim a atitude que ela própria tem perante o mundo.

Ser como uma criança é compreender que as virtudes não são artigos numa vitrine. São conquistas espirituais que se manifestam a cada nova oportunidade de fazer o bem, sem premeditação ou interesse.

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